Músico cristão, posso tocar secular?

Por Edvaldo Tomé

Meu amigo Matheus Muniz, me fez o seguinte questionamento via facebook:

"Ed. gostaria de ouvir sua opinião sobre um pesamento que tive, a respeito de música. Vamos comparar uma engenheiro e um músico. Um engenheiro estuda e se forma, arruma um emprego em uma empresa qualquer. O músico a mesma coisa, estuda e entra para alguma banda ou estúdio. Por que um cristão pode ser um engenheiro que trabalha para uma empresa mundana e um músico não pode tocar em uma banda mundana? Da mesma forma que produto da profissão engenheiro são seus projetos as músicas para o músico. Por que eu posso projetar para uma empresa mundana mas não posso fazer uma música pra uma banda mundana?" (sic)

Bom, este tema é bastante pertinente e vou tentar responder à questão posta sendo bem simplório.

Verifica-se nas diversas faculdades federais do nosso país, o curso de "música popular", que é voltado para a musicalidade popular, folclórica, menos próxima das escolas eruditas, como é de tradição nas academias do Brasil. Assim como um músico orquestral, o músico popular estaria habilitado para seguir carreira, vendendo sua força de trabalho para o mercado e vivendo dignamente como qualquer outro profissional das outras áreas.

Ora, assim como existem cursos como direito, medicina, fisioterapia, enfermagem, engenharia e outros, existe também o curso de música, que conforme já informado, capacita o aluno em sua carreira como músico.

Mas, e os cristãos? Não devem estudar música? Por qual motivo? Assim como temos, médicos, advogados, engenheiros, enfermeiros e etc., por que não ter um músico formado? E por qual motivo ele não pode trabalhar na área em que obteve formação?

Quero dizer que os músicos não as únicas pessoas com estes problemas. O que eu quero dizer é:

Um cineasta cristão. Ele ou ela só poderão participar de festivais de filmes cristãos?? E um cara com dom para poesia beat¹? Ele terá de se afastar de saraus em ambientes seculares? E um escritor trabalhando em um romance? Quanto “material cristão” será necessário em seu livro?

O ponto mais importante para questionar (e, às vezes, o mais difícil de responder) é: “Quais são os meus motivos para querer me envolver com a música secular?” A Palavra de Deus é clara: “Portanto, quer comais, quer bebais, ou façais outra qualquer coisa, fazei tudo para glória de Deus” (1 Co 10.31). Isso inclui a nossa arte.

Embora eu nunca presuma que os motivos de alguém serão completamente puros, existe uma diferença significativa entre quem vive para tocar nos palcos e quem vive para servir aos outros com seus dons.

Há inúmeros exemplos de canções populares que apresentam valores morais, perspectivas profundas e comentários significativos sobre a vida e que não façam referência direta às Escrituras. 

O mundo precisa ver, em todas as áreas, pessoas que tenham sido genuinamente transformadas pelo Evangelho.

Músicos cristãos inseridos no mercado secular têm a oportunidade de influenciar não-cristãos não apenas com suas músicas, mas com suas vidas. Deus pode ter dado a eles a oportunidade de compartilhar o Evangelho com pessoas que não seriam alcançadas de nenhuma outra maneira.

O músico e compositor cristão João Alexandre, assevera que cantar para a glória de Deus não significa cantar só música evangélica:

"É bom que se lembre que Deus não é evangélico. Deus é Deus. Há uma tendência de achar que a nossa música, ou a música executada pelos evangélicos, seja a música correta. (…) a música não possui caráter ou credo religioso. No tocante à letra, qualquer música que se enquadre naquele versículo que diz: “Quanto ao mais, irmãos, tudo que é verdadeiro, tudo que é justo, tudo o que é puro, tudo que é amável, tudo o que é de boa fama, se há alguma virtude, e se há algum louvor, nisso pensai”.(Filipenses 4:8); pode ser cantada, não precisa ser necessariamente música evangélica. Existem músicas que nem evangélicas são, e que falam sobre verdades muito bonitas, sobre valores intrínsecos, os quais estão de acordo com os valores bíblicos. Tudo o que está contido na Verdade bíblica é passível de ser cantado, sem qualquer constrangimento."

Mas o cerne da pergunta é sobre a possibilidade ou não de um músico cristão trabalhar fora dos ambientes da igreja. O que está em evidência aqui não é a profissão "músico" e sim o ambiente no qual ele trabalha. Se fosse para levar ao pé da letra (o que muitos religiosos dizem), seria necessário que os profissionais (cristãos) saíssem do mundo. (1 Co 5.10)

João Alexandre aduz sobre esta questão:

"O ambiente no qual o músico trabalha é um ambiente geralmente rotulado como pernicioso e nocivo à moral pela maioria do setor evangélico da sociedade. Isto acontece pelo fato de haver em alguns desses lugares a presença de drogas, bebidas, e coisas do gênero. Todavia, gostaríamos de lembrar aos leitores de que o ambiente de trabalho de um músico não se restringe “única e exclusivamente” a lugares como os descritos acima. Existem outros ambientes sociais onde o músico pode exercer a sua profissão, tais como: concertos de música clássica, casamentos, recepções, etc.; os quais são desprovidos deste caráter pernicioso. Além disso, as drogas, bebidas, e coisas do gênero também estão presentes em outros ambientes de trabalho tais como: hospitais, na política, etc. Não é necessário ser músico para entrar em contato com a triste realidade do mundo a nossa volta. Vale a pena dizer que nem sempre o músico tem o privilégio da escolha. Em tempos de “vacas magras”, a fim de sustentar sua família (pois apesar da desatenção de muitos, sim! o músico também é pai de família, e como tal possui muitas possibilidades) ele pode vir a ter que tocar em ambientes que não são de sua preferência pessoal, o que não significa que por isso ele venha necessariamente corromper-se, ou coisa semelhante."

De mais a mais, acredito que um músico cristão, deve estar sempre preparado para enfrentar ambientes sem se deixar influenciar, e se possível, influenciar pessoas para o Reino de Deus. Penso que o papel da comunidade cristã é dar respaldo espiritual ao músico que tem atividades fora da igreja, para que o mesmo possa ser canal de bençãos para aqueles que ainda não conheceram o amor de Deus.

Dito isto, e por todas as razões aqui aplicadas, entendo Matheus Muniz, (salvo melhor juízo), que o músico cristão pode trabalhar nos ambientes não cristãos, sabendo que tudo que ele faz deve ser para a glória de Deus (1 Co 10.31).

"Tens tu fé? Tem-na em ti mesmo diante de Deus. Bem-aventurado aquele que não se condena a si mesmo naquilo que aprova." Romanos 14:22

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Entrevista de João Alexandre disponível em: http://www.artedechocar.com/?s=m%C3%BAsico+crist%C3%A3o+secular&x=0&y=0

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